mandinga

January 5, 2011

PAC

Filed under: General,NA AVENIDA — mandinga @ 4:28 pm

Aos pactos que vamos tecendo… bem ou mal, crio aqui no cerrado. “Tomar posse” em Brasília, “tombar a cidade” de Brasília são expressões que costumamos ouvir. Fim de semana da posse da primeira mulher a chegar ao cume do poder executivo nacional. Isso demanda um oceano de subjetividade…. des/re – constrói um tanto nossos imaginários. Nao fui a praça dos 3 poderes, preferi a torre de televisão, matar a fome. A feira tava tomada de policiais. Minha fome física pedia que a primeira refeição da década fosse o bolo de fogo poderoso de oya. Um acarajé recheado com caruru, vatapá, camarão… enxarquei ! E com a chuva fininha me dei de sobremesa uma tigela de acai da barraca do pará (ui!) – tava ali fartando das comidas de tantas culturas, brasileiras e mundiais, rolezin bacana…

Sorrateirinha me dispus em frente a tv que transmitia a posse da Dilma, a despedidade de Lula. O dia histórico. Eu molhando sob a lona e cercada de olhos que fitavam o espetáculo da posse. Daqui a pouco começam as falas: “emocionante, neh ?” , “nossa ela é tão diferente pessoalmente, cabamos de ver ela lá no rolisroice”, “a televisão muda a gente…”, “nossa uma mulher que já foi estuprada chegou ao poder”… quantos elementos iam temperando o caldo vigoroso do açaí. Compartilhando o dia histórico com brasileiros e brasileiras. E como sempre faço em momentos de pensamentos demandantes… me transportei. comecei a pensar nas coisas que acompanhei com os movimentos sociais nos anos recentes… as várias manifestações do povo na esplanada – merece destaque a prisão de vários camponeses e crianças em 06.06.06 – (uma data cabalística, uma ação cabalística, um resultado cintilante da esquerda nacional) e dei um pulo aos espelhos, comecei a lembrar dos espelhos d`água, que recentemente os representantes do povo mandaram construir mais espelhos para evitar que o povo chegasse até o Congresso (comumente chamado de a casa do povo), entre muitas festas da democracia nacional.

morar em Brasília (como em qualquer grande centro urbano) é conviver com contradições, mas 30 anos depois ainda não consigo consenti-las… Comecei uma retrospectiva minha com a cidade, tarefa infinita, mas dessa vez me entreguei e tinha a sensação sensorial de cada lembrança do cheiro, do tato, do som, das cores…. Neste 2010 a cidade completou 50 anos, eu 30, meu filho 10. Lembrei de algumas coisas da infância, entre os eixos, entrequadra, na asa do rumo norte. Sempre amei brincar de comidinha, sina… E meu ingrediente favorito era a sementinha vermelha de pau-brasil…, a árvore que se esparramava ao alcance dos pilotis. E juntar os graozinhos, aquece-los nas maos, distribuir nas panelinhas (as imaginarias inclusive) e por que nao engolir aquelas bolinhas vermelhas, muitas vezes dadas como veneninhos, pequenos feitios …

Na mesma quadra, nessa mesma época tinha um amiguinho que adorava: o juruninha. O filho do juruna que nunca conseguiu conviver com as crianças da tribo que tinha vindo viver com o pai deputado nos meados dos anos 80. Lembro que ele tinha um jeito de brincar que de alguma forma despertava o pânico nas crianças. Ele conseguia lançar um vareto numa velocidade e com tal força que quebrava a pernas das outras crianças. Então, quando a criançada tava ali brincando nos piques e aparecia juruninha com seu graveto pra cumprimentar a meninada, todo mundo corria. era assim que ele costuma dizer oi aos colegas da nova tribo, tamanha sua fúria com o novo ambiente… mas comigo tínhamos um pacto de olhares, e era belo e bom e sempre brinquei com ele silenciosamente. De mato, de terra, de sementes. As vermelhas, as de pau, Brasil. Trago um encanto especial por essa fluidez selvagem que me trazia o juruninha… anos depois me chegou um texto fantástico dos vilas – boas sobre o primeiro contato com os juruna e a surpreendente maneira como se comunicavam por assobios… passei a assobiar, e imaginar diálogos com meu amigo que ja nem sei por onde se banha, mundo afora…

Pulo pros fins de semana dos anos 80, que bem sabemos muitas famílias iam até a praça dos 3 poderes passear… não era programa de turista, era programa nativo. E o Congresso era nosso espaço, nosso parque, nossa praça. Podíamos correr livremente por ali. E as árvores mais prazerosas de brincar eram as tigelas … delicia escalar a tigela de boca pra baixo. Um dia resolvi subir, devagarinha, subir e subir, ate que com uns 6 anos de idade subi ate o ponto máximo da tigela… e meus pais ficaram lá em baixao daquela altura desesperados pra que eu descesse. Eu sentia um profundo prazer de estar ali em cima ! mas veio um medo enorme dos meus pai em pânico .. o que me tirou aquele bálsamo da conquista… e comecei a descer, do único modo possível: escorregando. alivio.vento.

Volto pra barraca, pra Dilma na TV. E não largo da frase do compatriota ao lado “uma mulher que já foi estuprada chegou a poder”. Lembrei de um livro da minha vida, do Luiz Maklouf Carvalho, ” as mulheres que foram a luta armada”, lembro da dilma da tv digital que não ouviu os movimentos sociais na época sobre o padrão a ser adotado pelo Brasil, lembro da defesa das hidrelétricas em detrimento da preservação dos ecossistemas… e de uma vez, proseando com meu grande amigo e companheiro na península dos ministros ela aparecer do nada e nos cumprimentar as 6 matina, confesso que estávamos num estado bohemio suprapartidário hehehe… e rimos muito da situação. Dessa vez a TV nao reproduzia a coroação da miss… a faixa era de presidente.Inegável, a sensação de data histórica, ainda que o patriarcado dite as regras do jogo e o espetáculo se reproduza aos olhos velozmente.

No dia anterior dava viva as ANTIHEROINAS que me rodeiam. Tava numa roda de prosa deliciosa com as amigas, cafezando pra embarcar uma delas pra salvador, a cidade semente. O mais engraçado é a sabedoria feminina expandindo desses encontros… uma logo comenta: “Brasília é um coito interrompido” ! Dai só complementos: “um baile de máscaras”, ” os caras não dão conta das nossas fomes”, “com os anos ficamos muito seletivas com quem tomamos café da manhã”, depois horas de prosa com roupa na casa de uma amiga, jornalista, militante, rimos daquele jeito selvagem, mas rimos muito mesmo da nossa sexualidade cotidiana. E no dia seguinte casa da minha amiga mais sol na atualidade. A que fareja, a que corre com as lobas (e ela nem sabe que tem esse poder) … mas, ali no primeiro almoço de domingo da nova década ela veio me trazer uma aula de como ser a mãe-hacker mais linda do planeta . Nova década, adoro o instinto maternal aguçado. Amo as que se dedicam com amor a criar e hackear. Ela tem cuidado, carinho e liberdade nas horas dali. bonito de presenciar. Rizoma.

Dilma no palácio e nós aqui na rua !

ps.: … e toda vez que passo ali na 302 norte onde estudei no jardim de infância juro que ainda vejo o Ulisses Guimarães fazendo cooper pelas calçadas temo e acho graça entre a latunia da criançada e o cheiro da escolinha de manhãzinha… !

2 – Revendo 2010: me apaixonei de verdade. Platonicamente. Inclusive pela tequila. Sai no galinho e foi o melhor carnaval. Depois de 7 anos consegui a Pensão Alimentícia do meu filho. Participei da edição histórica do Jornal Radcal.Sustentei a casa de cultura que trabalho – quase falimos por falcatrua do GDF. Consegui um sócio certeiro. Organizei vários festivais de skate e futebol da molecada amiga do meu filho. Amei mais ainda ser mãe. Fundei (mais um monte de mina massa) a rede mulheres da cultura. Vi minha militância pelos direitos reprodutivos ir pelo ralo durante as eleições. Ganhei a dani, alice, lara, camila, a pati, lana, vânia e yaso como irmãs. Sobrevivi e consegui salvar uma tia de um hospital psiquiátrico.Acompanhei minha vó desfalecendo lentamente. Me tornei terapeuta reikiana. Voltei a estudar economia e exatas e to amando. Vi uma tempestade de areia, senti um terremoto. Aprendi a dizer não. Escolhi a solidão, enfrentei e deleitei. Voltei a cantar com a Ellen Oléria. Retomei a dança do ventre com a Padma. Fui muito amada pelas minhas amizades. Vi mais uma Copa. Ativei muitos sonhos próprios e alheios e gosto muito disso. Participei de várias cerimônia lindas, no terreiro matriarcal que construo-vivo. Entrei pra associação de mulheres empreendedoras. Construi uma nova loja linda pra alimentar e divertir mais centenas de pessoas. Aumentei minha equipe de colaboradores e somos um time feliz. Comecei o pompoar, a usar o copomenstrual, a fumar artemísia. Chegou a sacerdotisa, me empoderei dos meus dons espirituais, li muitos livros fantásticos. Revi meus valores, aumentei o autoamor, direcionei anseios. Ganhei um toca-vinil e muitos presentes impressionantes. Distribui conforto, colo, dicas, saberes, amor, idéias, presentes. Reativei e abri blogs, perdoei e botei pra descansar vários desafetos e predadores. Acendi fogueiras, banhei de mar, de chuva, de cachoeira, de lua.Cozinhei, costurei, fiz doces. Comecei um projeto de VJ e vídeos livres – o ve se te enxerga, alimentei o Teatro Oficina e a Elza Soares, descobri que amo o BNegão e o Buguinha Dub, Redescobri significados – especialmente o de resistência (fortalecer, tornar robusto, endurecer).E o melhor: pari a selvagem !

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